29/08/09

LER OS CLÁSSICOS - 112


capa de Ilda David.


Noite escura


Em uma noite escura, com ânsias,
em amores inflamada,
oh ditosa ventura!,
saí sem ser notada
estando minha casa sossegada.

Na escuridão, segura,
pela secreta escada disfarçada,
oh ditosa ventura!,
no escuro ocultada,
estando minha casa sossegada.

Nessa noite ditosa,
secretamente, que ninguém me via,
de nada curiosa,
sem outra luz nem guia
senão a que no coração me ardia.

Só esta me guiava
com mais certezas que a luz do meio-dia,
aonde me esperava
quem eu bem conhecia,
num sítio onde ninguém aparecia.

Oh Noite, que me guiaste!
oh noite mais amável que a alvorada!
oh noite que juntaste
Amado com amada,
amada em seu Amado transformada.

Em meu peito florido,
que só para ele inteiro se guardava,
ficou adormecido,
e eu o afagava
e o leque de cedros brisa dava.

A viração amena,
enquanto seus cabelos eu espargia,
com sua mão serena
o meu colo feria
e meus sentidos todos suspendia.

Detive-me, olvidei-me,
o rosto reclinei sobre o Amado,
cessou tudo e deixei-me,
deixando o meu cuidado
por entre as açucenas olvidado.


S.Juan de la Cruz - Poesias Completas
(tradução: José Bento - Poesias Completas,
Assírio e Alvim)

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