09/12/10

POETAS MEUS AMIGOS - 142


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img:ítaca


Um Homem Deseja Ir, Um Homem Deseja Voltar

Tantas vezes coube o céu em meus olhos
que o próprio céu se mudou em raiz
saída da fundura mais doída.
Entrava nova estação e eu sabia
que luar a cingiria e qual fogaréu
traria as cinzas do dia futuro.
Era belo, mas também magoava
e dessa mágoa somada ao encanto
e desse encanto onde cantos eu
buscava vinham a idéia de que Ítaca
era minha e era o que me bastava.
Em Ítaca, mar e céu são inteiros.

Mas Ítaca não existe se não
existe casa para trás deixada.
Preciso é que a distância se desdobre
não em algo maior ou nunca visto
mas em algo que o sangue não conheça
como seu, ainda que imagens gêmeas
sejam dos muitos dias repetidos.
Eis o luar, e o lusco fusco,
e a luz embebida em luz, fogo leve,
não diferente da brandura de abril
embora lá seja fim de setembro,
quando as folhas ainda não morreram
e o mar ainda devolve crianças.

Um mundo multiplicado em espelhos
é imenso ou é repetição?
Longe, encontrei beleza que aqui
não existe, mas o que me aturdiu
é que o pólen de todo o coração
é soprado por um único deus
ou é vestígio de única ruína.
Longe, outras ítacas encontrei
e quanto mais eu as tornava minhas
mais a casa deixada para trás
era dor que ia do vermelho ao branco
e do branco ao vermelho juvenil.
O mundo multiplicado em espelhos
é distorção porque o centro perdeu
e um homem que se perde do seu centro
é a aventura do retorno, entre ítacas
derruídas e ítacas do porvir.

Daniel Francoy
http://oceuvazio.blogspot.com/

O Daniel publicou recentemente, em, Portugal, o livro Em Cidade estranha - ed.Artefacto, 2010 - http://www.eartefacto.blogspot.com/;artefacto@gmail.com

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